Detenção administrativa: uma infame herança colonial britânica

Khalil Awawda suspendeu na passada quarta-feira a sua greve de fome de 172 dias após ter chegado a um acordo com as autoridades israelitas para estabelecer um limite máximo para a sua detenção administrativa e ser libertado a 2 de Outubro, de acordo com a Comissão de Assuntos dos Detidos e Ex-Detidos.

Awawda, um pai de quatro meninas, está detido desde 27 de Dezembro do ano passado. Foi-lhe determinada uma detenção administrativa de seis meses, contra a qual protestou iniciando uma greve de fome, que suspendeu ao fim de 111 dias com base em promessas de o libertar. Em 2 de Julho retomou a greve por a autoridade de ocupação ter renegado a sua promessa e renovado a sua detenção administrativa por mais quatro meses.

Awawda permanecerá no hospital para recuperar após sofrer uma grave deterioração da sua saúde, de acordo com a Sociedade de Prisioneiros Palestinos. Fotografias divulgadas no domingo por organizações de direitos humanos suscitaram reacção de um representante da União Europeia que se mostrou chocado e reclamou «a menos que seja acusado imediatamente, tem de ser libertado».

No final de Agosto de 2022, mais de 720 pessoas estavam detidas administrativamente, todas elas palestinas. É o número mais elevado desde 2008.

A base legal para a utilização por Israel da detenção administrativa é o Regulamento de Defesa (de Emergência) do Mandato Britânico de 1945 cujas disposições foram adoptadas e reapropriadas pelas autoridades israelitas e reflecte uma das mais explícitas continuidades coloniais entre o direito colonial britânico e o direito israelita.

A detenção administrativa foi uma das práticas extensamente empregadas pelo Império Britânico nas suas colónias, nomeadamente na Irlanda, na Índia, no Quénia, no Egipto, na África do Sul, na Malásia, na Birmânia e na Palestina.

As ordens de detenção administrativa são emitidas até seis meses, renováveis indefinidamente, com base em "informações secretas" de que a pessoa representa uma "ameaça à segurança" para a região. Nem o detido nem o advogado têm acesso a esta informação, que só é partilhada entre os serviços secretos israelitas, o procurador militar israelita, e o juiz militar.

Israel justifica a sua utilização da detenção administrativa nos territórios ocupados com o artigo 78 da Quarta Convenção de Genebra de 1949: «Se a Potência Ocupante considerar necessário, por razões imperativas de segurança, tomar medidas de segurança relativas às pessoas protegidas, pode, no máximo, sujeitá-las a residência atribuída ou a internamento.»

No entanto, a prática generalizada e sistemática de detenção administrativa por parte das autoridades de ocupação israelitas excede em muito os parâmetros excepcionais estabelecidos pelo Direito Internacional Humanitário.

Assim o consideram os Relatores Especiais da ONU que apelam repetidamente a Israel para que elimine a sua prática de detenção administrativa, liberte os detidos que retém actualmente, e siga rigorosamente o direito internacional na aplicação das suas operações de segurança.

Também o Comité Contra a Tortura da ONU apela ao governo israelita para «tomar as medidas necessárias para pôr termo à prática da detenção administrativa e assegurar que todas as pessoas que se encontram actualmente detidas administrativamente beneficiem de todas as salvaguardas jurídicas básicas».

A Amnistia Internacional acredita que a detenção administrativa viola o artigo 9º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (ICCPR) que estipula: «Todo o indivíduo tem direito à liberdade e à segurança pessoais. Ninguém poderá ser submetido a detenção ou prisão arbitrárias. Ninguém poderá ser privado da sua liberdade, excepto pelos motivos fixados por lei e de acordo com os procedimentos nela estabelecidos.»


Foto: Khalil Awawda hospitalizado na sequência da greve de fome de protesto contra a sua detenção administrativa (WAFA)

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