Tantura: O filme do massacre está no DocLisboa

Na noite de 22 para 23 de Maio de 1948, uma semana após o estabelecimento do Estado de Israel, o 33º batalhão da Brigada Alexandroni lançou um ataque contra a aldeia palestina de Tantura, utilizando fogo de metralhadoras pesadas seguido de um ataque de infantaria. O combate foi de curta duração mas, após a rendição dos aldeãos, as milícias sionistas procederam ao massacre de mais de duas centenas de prisioneiros desarmados.

A notícia do massacre era conhecida do lado palestino, mas sistematicamente negada pelo lado israelita. Uma tese de mestrado de Theodore Katz, um aluno da Universidade de Haifa, que confirmou a ocorrência do massacre com base em dezenas de testemunhos de sobreviventes palestinos e de milicianos sionistas, foi denegrida e o seu autor perseguido em tribunal. O historiador Ilan Pappé, professor de Katz, defendeu a veracidade da tese o que lhe valeu a expulsão da Universidade de Haifa e o exílio em Inglaterra, onde é professor na Universidade de Exeter.

Mas o tema do massacre de Tantura voltou à actualidade, com enorme ressonância, com a estreia mundial do filme Tantura, do realizador israelita Alon Schwarz, no Festival de Cinema de Sundance, no dia 20 de Janeiro deste ano. Schwarz partiu das gravações áudio de Katz e reuniu novas entrevistas com vários ex-soldados e outras testemunhas que confirmam o massacre e fornecem detalhes aterradores.

Tantura está agora no programa do DocLisboa. Teve uma primeira exibição no passado dia 7 de Outubro e será novamente exibido no dia 16, às 18.30 horas, na Sala Manoel de Oliveira do Cinema São Jorge, em Lisboa.

Tantura era uma tranquila aldeia costeira, nas encostas do Monte Carmelo, no Norte da Palestina e tinha cerca de 1700 habitantes que viviam da pesca e do cultivo de cereais e pomares de citrinos, bananas e outras árvores de fruto. Mas a sua localização ditou o seu destino. Em 11 de Maio de 1948, David Ben-Gurion ordenou à milícia sionista Haganah que procedesse à «limpeza» de Tantura e outras aldeias que constituíam um enclave árabe na estrada entre Telavive e Haifa. A Brigada Alexandroni foi encarregada da tarefa com as consequências que hoje se conhecem.

Poucas semanas depois da limpeza étnica de Tantura, um grupo de colonos sionistas estabeleceu aí o kibbutz de Nahsholim. Instalaram-se nas casas dos palestinos mortos ou expulsos e fizeram a colheita dos cereais e dos frutos que estes tinham cultivado. No ano seguinte, novo grupo de colonos fundou o moshav de Dor, um pouco mais a sul.

Sobre as ruínas de Tantura ergue-se hoje a estância balnear de Dor, que serve os dois povoamentos, e é um local de atracção turística. O seu parque de estacionamento foi construído sobre a vala comum onde foram sepultadas as vítimas do massacre de Maio de 1948.

Das muitas dezenas de massacres perpetrados pelas milícias sionistas entre 1947 e 1949, só dois se comparam a Tantura em dimensão: Deir Yassin, perto de Jerusalém, e Lydd, actualmente a cidade de Lod, de maioria judaica, perto do aeroporto Ben-Gurion.

De acordo com os relatos dos historiadores e das pessoas envolvidas, os outros dois massacres em grande escala — em Deir Yassin e Lydd — ocorreram em circunstâncias diferentes, e foram provavelmente mais bem planeados. Ilan Pappé acredita que a extensão do massacre em Tantura ocorreu como resultado de uma operação de expulsão mal planeada.

Para saber mais sobre Tantura e o massacre, leia:

Tantura: De aldeia piscatória a estância balnear com um massacre pelo meio

Nesse artigo descrevemos as vicissitudes por que passou Theodore Katz que acabaram por provocar um acidente vascular que o incapacitou e a perseguição a Ilan Pappé por o ter apoiado; referimos algumas das muitas entrevistas com que Schwartz confirmou e complementou as gravações de Katz; confirmamos a existência de uma vala comum sob o parque de estacionamento da estância balnear de Dor e damos a palavra a Jonathan Cook para descrever a manifestação de Maio de 2015 — em que estiveram presentes Ilan Pappé e Teddy Katz — em que centenas de activistas desfilaram na Praia de Dor numa tentativa de pôr fim ao longo silêncio sobre Tantura imposto à memória colectiva dos israelitas.
 

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