Shireen: Um ano após o seu assassinato amigos e familiares ainda aguardam justiça

Em 11 de Maio de 2022, Shireen Abu Akleh, uma jornalista palestino-americana da Al Jazeera, foi morta por um atirador israelita quando cobria uma rusga das Forças de Defesa de Israel (IDF) ao campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia ocupada. Shireen foi alvejada no rosto, apesar de usar capacete e um colete identificativo de imprensa. Um ano volvido, amigos e colegas prestam-lhe homenagem e reclamam a justiça que tarda.

A indignação pela morte da repórter foi exacerbada pelas cenas de violência no seu funeral em Jerusalém, quando a polícia israelita atacou os carregadores do caixão, quase o fazendo cair. O funeral, que reuniu dezenas de milhares de pessoas, foi considerado o maior funeral palestino em Jerusalém nos último 20 anos.

As IDF, que inicialmente tinham sugerido que Shireen tinha sido morta por um resistente palestino e mais tarde que tinha sido apanhada num fogo cruzado entre os soldados israelitas e resistentes palestinos, acabaram por admitir que havia uma "grande possibilidade" de Abu Akleh ter sido morta por um soldado, mas afirmaram que o tiro fora acidental e que não se justificava uma investigação criminal.

Nas semanas que se seguiram à sua morte, várias análises independentes, incluindo uma das Nações Unidas, concluíram que as forças israelitas eram responsáveis. No passado mês de Julho, o grupo palestino de defesa dos direitos humanos Al-Haq e a agência de investigação Forensic Architecture, sediada no Reino Unido, publicaram uma reconstituição pormenorizada do tiroteio, concluindo que Abu Akleh tinha sido deliberadamente atingida.

Ser jornalista na Palestina é um trabalho muito perigoso. Os jornalistas enfrentam intimidação diária por parte dos colonos e arriscam ser mortos ou feridos pelos soldados que estão seguros da sua impunidade.

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As homenagens

Esta tem sido uma semana de memoriais e eventos que celebram a vida de Shireen Abu Akleh.

Num concerto de homenagem, em Ramala, no início desta semana, centenas de pessoas reuniram-se para recordar uma notável pioneira e o seu legado.

As homenagens da família e dos colegas de Abu Akleh no concerto de terça-feira falaram da sua dedicação em mostrar ao mundo as duras realidades da ocupação israelita, bem como os momentos de felicidade e resiliência. Um coro feminino de Jerusalém e jovens mulheres do Conservatório Nacional de Música Edward Saíd interpretaram várias peças compostas em sua memória.

Várias universidades anunciaram a atribuição de prémios e bolsas de estudo em nome de Abu Akleh, uma rua de Ramala foi rebaptizada com o seu nome e o seu nome perdurará também sob a forma de um museu dos meios de comunicação social que deverá ser inaugurado na cidade em 2025.

O programa anual de formação para radialistas e jornalistas palestinos, criado pela ONU em 1995, recebeu em 2022 o nome de Shireen Abu Akleh por decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas.

As investigações

No ano que se seguiu à morte de Shireen, os esforços internacionais de responsabilização avançaram com uma lentidão dolorosa

Até à data, ninguém foi responsabilizado pela morte de Abu Akleh. As autoridades israelitas encerraram rapidamente o caso, recusando-se a formular acusações. No entanto, apesar de a administração Biden ter apoiado em grande medida a versão israelita dos acontecimentos e ter resistido a lançar uma investigação independente sobre o assassinato de uma cidadã americana, a pressão da opinião pública e de membros do Congresso obrigou-a a concordar com um inquérito do FBI em Novembro passado. Esta parece, por enquanto, ser a via mais promissora para a justiça — embora Israel tenha afirmado que não irá cooperar.

Juntamente com a família de Abu Akleh, a Al Jazeera apresentou um pedido formal de investigação do assassínio ao Tribunal Penal Internacional, cujo inquérito sobre uma série de alegados crimes cometidos na Palestina não registou grandes progressos desde que foi lançado em 2021.

Jornalistas vitimados

Abu Akleh está longe de ser o único jornalista palestino assassinado nos últimos anos cuja morte ficou impune. Um relatório do Comité para a Protecção dos Jornalistas (CPJ), divulgado esta semana revela que Israel nunca acusou ou responsabilizou qualquer soldado pelo assassínio de pelo menos 20 jornalistas, 18 dos quais palestinos, desde 2001.

Tal como Abu Akleh, a maioria dos mortos — pelo menos 13 — estavam claramente identificados como jornalistas ou dentro de veículos com insígnias da imprensa quando foram mortos, de acordo com o relatório. Muitos mais jornalistas foram feridos pelas forças israelitas, que também atacaram repetidamente as sedes dos meios de comunicação social. Durante um ataque militar a Gaza em 2021, por exemplo, Israel bombardeou edifícios onde estavam sediados mais de uma dúzia de meios de comunicação locais e internacionais, incluindo a Associated Press e a Al Jazeera.

No seu relatório, o CPJ adverte que a violência israelita contra os jornalistas tem um "efeito inibidor" que mina a liberdade de imprensa. Esse efeito inibidor, disseram alguns jornalistas palestinos ao Intercept, não vem apenas na forma de medo, mas também de um senso de propósito perdido e da impressão de que suas vidas são consideradas indignas.

Actualmente há 16 jornalistas palestinos detidos sem acusação.

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