«Por que é que a UE está a recompensar Israel pela anexação?», por Majdi Khaldi

A excitação de alguns dos nossos amigos europeus é verdadeiramente espantosa.

No mês passado, o Ministro dos Negócios Estrangeiros israelita Gabi Ashkenazi foi convidado pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros alemão Heiko Maas para se encontrar com todos os Ministros dos Negócios Estrangeiros europeus no contexto do Conselho dos Negócios Estrangeiros da UE.

A Palestina não foi convidada.

Independentemente de quaisquer explicações relativas às relações UE-Israel, a ocasião foi vista como uma recompensa por «suspender» uma declaração formal de anexação.

Por outras palavras, Israel anuncia que irá formalizar um crime que já está a cometer e quando diz que não o anunciará «durante algum tempo» alguns sentem a necessidade imediata de recompensar Israel, incluindo a realização de um conselho de associação.

A mensagem é simples: a anexação de facto e outras violações israelitas em curso não são um obstáculo à melhoria das relações.

Os parâmetros internacionalmente acordados para o processo de paz no Médio Oriente, endossados pela União Europeia e pelos seus Estados membros, são simples e não são passíveis de interpretações: é uma solução de dois Estados que põe totalmente fim à ocupação israelita que começou em 1967 com Jerusalém Oriental como capital do Estado da Palestina e uma solução para todas as questões de estatuto final baseada no direito internacional e nas resoluções relevantes da ONU.

O foco no fim da ocupação é fundamental para quaisquer perspectivas de paz.

As recompensas ao governo israelita na ausência de qualquer cumprimento por Israel das suas obrigações apenas servem para perpetuar a negação dos direitos palestinos e o reforço de um regime de apartheid.

As relações europeias com a Palestina podem ser resumidas em três aspectos principais: as relações políticas, com um alegado apoio à solução de dois Estados, embora a maioria dos governos da UE ainda se abstenha de reconhecer o Estado da Palestina - observando ao mesmo tempo que vários parlamentos europeus têm vindo a instar os seus governos a fazê-lo.

O aspecto económico/desenvolvimento, incluindo os importantes esforços europeus no sentido da construção de instituições palestinas e da prestação de apoio à economia palestina, que tem sido gratamente reconhecido; e também o aspecto da responsabilização e do respeito pelo direito internacional.

Aqui verificamos que após 53 anos de ocupação colonial ilegal, os países europeus ainda não têm a coragem de responsabilizar Israel pelas suas violações sistemáticas.

Como a situação continua a deteriorar-se no terreno, com um número sem precedentes de demolições de casas e a expansão de colonatos em curso, ouvimos alguns representantes afirmar que a anexação está «fora de questão» e que, portanto, a coordenação com o lado israelita deveria ser retomada.

Não é feita qualquer referência à necessidade de Israel cumprir os acordos que permitiram a existência de qualquer coordenação, incluindo o Roteiro, bem como as suas próprias obrigações ao abrigo do direito humanitário internacional.

Mais importante ainda, não se pede ao governo israelita que subscreva dois princípios básicos: a solução de dois Estados e as suas obrigações ao abrigo do direito internacional.

Nenhum governo europeu pode afirmar que a Palestina não os envolveu na tentativa de encontrar uma saída para a situação actual.

Apresentámos um documento declarando as nossas posições para um acordo de estatuto final que estão em total consonância com as suas próprias posições enquanto europeus.

No lado diplomático, apelámos à realização de uma conferência internacional de paz que facilitará um processo de negociações baseado nos parâmetros internacionalmente acordados.

«Insulto ao direito internacional»

Mas alguns ainda nos pediram para apresentar uma contraproposta ao plano dos EUA.

Quem quer que tenha lido o plano dos EUA pode facilmente concluir que é um insulto ao direito internacional e aos princípios mais básicos sobre os quais a União Europeia foi fundada.

Vamos fazer uma pergunta retórica. Seria a União Europeia autorizada pelos seus membros a participar num processo de paz baseado em qualquer um dos princípios apresentados pelo Plano dos EUA? A resposta é simples: Não.

Este é um momento crítico. O acordo EAU-Israel, saudado pela União Europeia, representa um rude golpe para a Iniciativa de Paz Árabe.

Referido como os «Acordos de Abraão», o texto representa um reconhecimento da soberania de Israel sobre Jerusalém Oriental ocupada e uma ameaça directa ao status quo do complexo da Mesquita de Al Aqsa, e portanto também aos locais santos cristãos.

Tanto o acordo EAU-Israel como os que apelam ao estreitamento dos laços europeus-israelitas, ignoram simplesmente a paz no Médio Oriente como a sua prioridade.

Eles recompensam o mau comportamento e as políticas criminosas. O último anúncio feito pelo Barém também vai no mesmo sentido. Recompensar a ocupação israelita provou ser uma fórmula falhada que não trará a paz.

O que os países europeus podem fazer é acelerar o reconhecimento do Estado da Palestina nas fronteiras de 1967, de acordo com o direito internacional e os princípios em que acreditam.

Este acto político servirá de catalisador para a paz e inspirará como um raio de esperança nos corações e mentes do campo de paz palestino. Isto irá verdadeiramente lançar as bases para a segurança, estabilidade e paz real na região.

A concentração em medidas concretas para acabar com a ocupação colonial israelita ilegal, incluindo medidas de responsabilização, tais como a proibição de produtos dos colonatos, e a ênfase nos parâmetros internacionalmente acordados, é a forma de avançar.

É assim que Israel compreenderá que a paz e a segurança regionais não começam em Abu Dhabi ou noutro lugar, mas aqui com um acordo de paz justo entre a Palestina e Israel, com base no direito internacional.


O Dr. Majdi Khaldi é o conselheiro para os assuntos diplomáticos do presidente palestino Mahmoud Abbas.

Este artigo foi originalmente publicado no jornal digital EUobserver em 17 de Setembro de 2020. Tradução do MPPM.

Os artigos assinados publicados nesta secção, ainda que obrigatoriamente alinhados com os princípios e objectivos do MPPM, não exprimem necessariamente as posições oficiais do Movimento sobre as matérias abordadas, responsabilizando apenas os respectivos autores.

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