Não deixemos que transformem a América Latina num novo Médio Oriente!

COMUNICADO 02/2019

Os inimigos do povo palestino – com Trump, Netanyahu e Bolsonaro à cabeça – e as potências que há 25 anos ensanguentam o Médio Oriente com guerras agressivas e destruidoras estão ao ataque na América Latina.

Os factos multiplicam-se e não podem ser ignorados pelos amigos do povo palestino: entre outros, são as estreitas ligações de Bolsonaro a Israel; a presença de Netanyahu no Brasil aquando da tomada de posse de Bolsonaro; a proclamada intenção do governo brasileiro de transferir a sua embaixada para Jerusalém – no encalço da ilegal decisão de Trump –, ao mesmo tempo que desvaloriza a presença oficial palestina no Brasil; o apoio de Israel ao golpe na Venezuela, desencadeado pela proclamação pelos EUA de um «presidente» que nunca foi sufragado pelo voto popular; a presença militar israelita no Brasil, a pretexto de assistência humanitária às vítimas da catástrofe da barragem do Brumadinho e violando a legalidade brasileira.

Os algozes do povo palestino – que prosseguem o massacre de milhares de manifestantes palestinos na Grande Marcha do Retorno e persistem na violação de toda a legalidade internacional, em matérias tão cruciais como a construção do Muro do apartheid ou a sistemática alteração da realidade demográfica no território ocupado em 1967, através dos colonatos e das expulsões da população palestina – estão agora a alargar a sua permanente desestabilização e belicismo ao continente americano. É um sinal de alerta que todos os amigos da causa palestina não podem ignorar.

O MPPM adverte que a concretização dos planos golpistas significou ontem no Brasil, e significaria decerto na Venezuela, um duro revés para a causa do povo palestino, privando-o de importantes aliados no plano internacional. Vão nesse sentido as declarações da Autoridade Palestina e da generalidade das organizações políticas palestinas de apoio ao presidente Nicolás Maduro, que no início do seu segundo mandato reiterou a solidariedade da Venezuela com a luta palestina pela liberdade e a independência. Significaria também um perigoso reforço de Israel no plano internacional, que encorajaria a sua criminosa opressão do povo palestino e a concretização das suas ameaças de ataque militar ao Irão, na esteira das suas cada vez mais frequentes incursões contra a Síria.

Os governos dos EUA, de potências europeias da NATO e de Israel são activos promotores das desestabilizadoras operações de «mudança de regime» que visam inverter os processos de afirmação soberana da América Latina e fazer reverter essa região à sua tradicional posição subalterna — com o mesmo desprezo pela soberania dos povos, o direito internacional, a paz e a verdade que revelaram na Palestina, no Iraque, na Líbia, na Síria e em outros países do Médio Oriente. O que move esta ofensiva não são preocupações humanitárias ou democráticas – que até soam grotescas na boca de Trump, Bolsonaro ou Netanyahu. São ambições de dominar e controlar gigantescas riquezas (como sejam as enormes reservas de petróleo, ouro e outros minerais da Venezuela) e de esmagar governos que afirmem políticas independentes e soberanas, nomeadamente no plano energético e financeiro — as mesmas ambições já reveladas por um quarto de século de guerras e ingerências no Médio Oriente.

As ameaças abertas de intervenção militar dos EUA na Venezuela – a que Juan Guaidó já deu público aval – e as bravatas do Conselheiro de Segurança Nacional estado-unidense, Bolton, no sentido de prender em Guantánamo o presidente Maduro, são prova cabal da natureza belicista dos artífices desta operação e dos reais perigos de guerra na América Latina. Guerra que, como comprova a experiência de um quarto de século no Médio Oriente, apenas traria a morte, a destruição e a fragmentação de países, o caos. Uma tragédia para os povos da região, que abriria portas à pilhagem dos recursos naturais da Venezuela pelas grandes multinacionais sediadas nos países que promovem a agressão. Mas uma tragédia também para outros povos e países, desde logo – e como a realidade do Médio Oriente também comprova de forma dramática – provocando novos fluxos de fugitivos e refugiados, podendo afectar a importante comunidade luso-descendente da Venezuela e do Brasil, com impacte directo em Portugal.

O MPPM chama a atenção para o facto de ter sido despudoradamente ignorado no caso da Venezuela o argumento sempre invocado pelo governo português para não reconhecer o Estado da Palestina, como recomendado pela Assembleia da República e exigido pela mais elementar justiça histórica – o de não querer tomar decisões que não fossem consensuais no seio da União Europeia. A decisão do governo português de alinhar na operação desencadeada por Trump não foi aprovada ao nível da UE, onde encontrou a oposição ou as reservas de países como a Itália, a Grécia e a Irlanda. O governo português optou por trocar a proclamada solidariedade europeia pela indigna submissão a Donald Trump e Netanyahu. Esta posição é tanto mais condenável quanto é público o desprezo e a arrogância que estes revelam nas suas relações com a UE e as Nações Unidas.

Neste contexto, o MPPM não pode deixar de condenar vivamente a posição do governo português de envolver Portugal em estratégias de agressão e ingerência que marginalizam a ONU e violam o direito internacional, a Constituição da República Portuguesa e a Carta da ONU, nomeadamente os princípios de paz, respeito pela soberania dos países e resolução pacífica dos conflitos, estratégias essas que darão mais força ao crescimento da extrema-direita mais violenta e desrespeitadora dos direitos dos povos e do direito internacional, bem como de forças terroristas, como se comprovou no Médio Oriente. As campanhas mediáticas que acompanham os acontecimentos na América Latina são intensas e amedrontadoras. Mas sabemos, pela experiência de 25 anos de destruição do Médio Oriente, que são também monumentalmente mentirosas e de consequências catastróficas.

O MPPM apela aos amigos da causa palestina e dos povos do Médio Oriente, a todos os portugueses que desejam viver num mundo de paz e de respeito pela soberania dos povos, para que condenem o alinhamento das autoridades portuguesas com as perigosas operações belicistas e golpistas dos Estados Unidos da América, Israel e países da NATO e para que reclamem do governo português, – liberto do compromisso auto-imposto de consensualizar as suas decisões com a União Europeia – que reconheça o Estado da Palestina nas fronteiras de 1967 e com Jerusalém Leste como capital.

É tempo de exigir paz, respeito pelos direitos e soberania dos povos, pela Carta da ONU. Não deixemos que transformem a América Latina num novo Médio Oriente!

10 de Fevereiro de 2019
A Direcção Nacional do MPPM

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