Burocracia da diplomacia portuguesa ameaça o futuro de estudante refugiada palestina

Manal Makkieh nasceu há 23 anos num campo de refugiados palestinos no Líbano. Agora conseguiu uma bolsa da União Europeia para fazer um mestrado em Serviço Social com Famílias e Crianças no ISCTE-IUL que pode dar um rumo à sua vida. Mas não contava com teia burocrática da diplomacia portuguesa.

A odisseia de Manal é descrita pela jornalista Ana França em artigo no Expresso. Em Maio pediu um visto na Embaixada de Portugal no Chipre, onde são tratados os assuntos referentes ao Líbano. Passados seis meses, com o prazo de apresentação em Lisboa a terminar, sem ter o visto de estudante, Manal arrisca perder a bolsa e a oportunidade da sua vida.

Segundo relata o Expresso, a teia burocrática envolve três entidades: a Embaixada no Chipre, que disse ao jornal que aguarda instruções de Lisboa; o SEF, que garante nunca ter ouvido falar do assunto, e o Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), que se remete ao silêncio.

«A situação [no Líbano] é muito crítica, é desesperante, mas depois houve esta esperança de eu ser aceite num programa para estudar fora, era a minha única oportunidade de sair daqui para depois regressar e continuar os meus projectos na área da ajuda à infância», disse Manal ao Expresso.

«É confuso este triângulo, mandam-me para aqui e para acolá mas eu entreguei tudo o que me pediram: desde cartas de recomendação ao currículo, passando pela prova de aceitação no mestrado, visto Schengen para Espanha, certificados de todas as universidades onde estudei, incluindo em Georgetown, nos Estados Unidos. Não sou um elemento perigoso para Portugal.»

Entretanto, está a correr uma petição dirigida ao MNE para permitir a vinda de Manal para Portugal.

O caso de Manal não é único. Em Outubro de 2019 o MPPM tomou conhecimento de um pedido dirigido à Embaixada da Palestina pela Directora de Relações Internacionais da Universidade do Minho, Beatriz Araújo, para que intercedesse junto do MNE para desbloquear a situação de três estudantes palestinos de Gaza – Khaled F. A. Azzam, Mohammed R.H. Mamsnou e Mohammed A. A. Alfari – que tinham bolsas da União Europeia para estudar, ao abrigo de dois projectos ERASMUS+, um na Universidade do Minho e dois na Universidade Nova de Lisboa, mas não conseguiam obter os necessários vistos.

Com diferentes protagonistas, a teia burocrática é idêntica. Os estudantes são aconselhados a dirigir-se à representação diplomática portuguesa em Ramala, mas Israel não lhes permite que viajem de Gaza para a Cisjordânia. Dirigem-se então ao Consulado de Portugal no Cairo, que remete a decisão para o MNE, em Lisboa. O MNE não dá resposta, a teia fecha-se e os estudantes perdem a bolsa.

É singular a relação da diplomacia portuguesa com a União Europeia. Por um lado, Portugal não reconhece o Estado da Palestina porque, alegadamente, aguarda uma posição consensual dos seus parceiros, mas, por outro lado, bolsas de estudo aprovadas e concedidas pela União Europeia não são garantia bastante para que Portugal permita que os estudantes palestinos beneficiem delas em universidades portuguesas.

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